sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Coragem para renunciar?


As situações cotidianas muitas vezes cedem lugar para dúvidas e estas, por sua vez, podem não se resumir a questionamentos meramente simbólicos. As dificuldades para resgatar velhos sonhos são comuns e muitas vezes é difícil alcançar as respostas.

“Cortar na própria carne” é uma expressão conhecida, mas difícil de ser colocada em prática. Rejeitar preceitos, velhos hábitos, pressões moralistas ou mesmo ao status social adquirido ao longo dos anos para encontrar o “caminho certo” que nem sempre pode vir a ser realmente o certo, ousar. Sem dúvida são algumas das atitudes mais difíceis. Mas se não arriscarmos, poderia ser diferente?

Tais argumentos são comuns, não será a primeira ou a última leitura acerca de abdicações.

Muitas vezes já tive vontade de largar tudo e até brincava diariamente com o assunto: “se nada der certo, mochila nas costas, um tênis nos pés, pego a estrada e viro hippie”. Por tanta brincadeira passei a refletir sobre a opção destas pessoas.

Tenho certeza que você já reparou em alguma “tribo” hippie que vaga pela cidade ou já teve curiosidade em saber como é a vida em uma de suas comunidades. Eu confesso que já tive a curiosidade de perguntar certa vez, como quem não quer nada além de informações curiosas, sobre este estilo de vida a alguém deste grupo.

Era um rapaz, muito bonito por sinal, que na época não deveria ter mais de 25 anos. Apesar dos trajes muito sujos por sinal, a aparência não era de uma pessoa que nasceu pobre ou sempre viveu nas ruas. Uma maneira de conversar que não escondia que se tratava de alguém com boa educação e um jeito de se expressar que poucas vezes vi em alguém, denotando uma sabedoria que chegou a me espantar, já que no mínimo esperava alguém um pouco mais rude, como era comum (e ainda é) de encontrar entre os hippies pela cidade. O rápido diálogo foi mais ou menos assim:

Ele, como todos os demais do grupo, confeccionavam bijuterias e ficavam na praça central da cidade vendendo a mercadoria. Certo dia a curiosidade aguçada me levou a ir até lá com a desculpa de comprar algo e imediatamente perguntei: “por que escolher este estilo de vida?” No fundo as perguntas eram: “Por que não ter casa, emprego, um nome a zelar, uma família por perto? Qual a vantagem de andar por aí sem destino certo?”...

A resposta? Bem, não houve resposta. Ele sorriu e perguntou: “Acha errado este estilo de vida?”. Como não houve resposta a minha pergunta, claro que eu também não respondi a ele. Sorri de volta e argumentei: “Sempre digo que se nada der certo viro hippie”. Ele simplesmente respondeu: “Então jamais será! Não virei hippie por fracasso, foi uma opção de vida assim como as escolhas que você já fez.” – Nunca me esqueci desta parte final: escolhas que fiz.

Em pouco tempo entendi que coragem para abdicar de tal “normalidade” é uma opção difícil, mas é uma opção e recomeçar não quer dizer renúncia. Os questionamentos diários não nos pedem renúncias e sim recomeço, o que implica em repensar velhas atitudes. Acho que jamais serei hippie um dia, mas pude entender que querer o mais simples, buscar algo diferente do que é apresentado pela sociedade é questão de opção. O que a maioria das pessoas busca não é renúncia, mas simplesmente coragem e ousadia para recomeçar. Talvez na ocasião daquela simples conversa eu tenha aprendido a maior lição de todas, a de respeito pelas opções.

O caminho nem sempre é certo e nem precisa ser tão apropriado. Felicidade é uma causa transitória e por isso que buscá-la é uma atividade tão incansável. Não devemos ser tão sensatos ao ponto de criar moralismos e uma aceitação social constante, o que também não quer dizer que a rebeldia sem causa e a transgressão sejam a saída. Nada de extremos! Sejamos então ponderados, nada de renúncias!

Se você, assim como eu, não tem vocação para ser hippie, monge ou algo parecido, apenas recomece. Já é um ótimo passo.

Um comentário:

  1. Estou aqui pela objetividade e delicadeza das palavras.
    Procurando talvez um caminho, ou um recomeço.
    Abs

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